sexta-feira, 23 de maio de 2014

Indiferença

Peter Sloterdijik em seu lúcido e incômodo livro Crítica da Razão Cínica, mergulha na análise do porque nesses tempos em que vivemos, ela, a indiferença, reina. Em sua proposição mais aguda, o autor proclama que ao tomarmos a direção de tudo problematizar, naturalmente adotarmos postura de indiferença, por nos nivelarmos aos problemas ao pressenti-los. Então, não haveria razão objetiva para tentarmos ir contra a corrente? O autor não responde a esta pergunta. Na verdade esta pergunta eu me faço, e também a faço a quem se aventurar a ler esse texto. Vivemos tempos complexos e dentro dessa complexidade, contraditórios. Hoje, a humanidade está mais próxima de ver decifradas as causas de todas as doenças físicas que a ameaçam, mas ao mesmo tempo e contraditoriamente, parece não ser de interesse dos grupos controladores de tais conhecimentos, e não me refiro aos cientistas, mas sim à indústria química, que os benefícios destas descobertas alcancem a maior parcela possível da população. Será a materialização daquilo que apregoa Sloterdijik? Vá agora até a janela e olhe lá fora. Aqui, enquanto escrevo há sol, vento em forma de brisa que ameniza o calor emanado do sol. Está agradável. Da janela de onde estou, avisto um ambiente urbano, é uma avenida com transito intenso de veículos e pessoas. Observando à distância, tudo parece estar em sua rotina normal. Apenas parece. Vá, transponha a barreira física de sua casa, seu escritório, ou qualquer outro espaço que esteja agora separando você das pessoas lá fora. Tente se comunicar com alguém. Uma pessoa, uma única. Eu disse comunicar. Viver o processo de emitir e receber mensagens, codificando-as, compreendendo. Será praticamente impossível, o único alento é de que essa quase impossibilidade de "comunicação" do ser, é geral. Não importa se sua janela está em alguma rua de Istambul ou em Água Azul do Norte, no Estado do Pará, não importa. A diferença é de que as pessoas da pequena cidade reconhecem por razões de maior proximidade, o outro. Reconhecer não quer dizer "conhecer". A mesma sensação incômoda de não comunicação paira agora nos céus do Planeta. Este distanciamento, comportamento tomado por conta de nosso instinto de auto preservação, talvez, esteja provocando essa "indiferença" nossa de cada dia? E então na busca primeira de resguardar nossa segurança, criamos, ou melhor saímos às ruas vestidos com as "personas" que provocam em nós a sensação de estarmos protegidos. Protegidos da tentativa de "invasão" do outro. Permitir ao outro tomar conhecimento de nossa verdadeira pessoa, seria então arriscado demais. Logo, mantemos esta atitude de precaução. E este excesso afasta-nos. E toda esta nuvem da indiferença cai sobre nós em um dos momentos tecnicamente mais propícios ao encontro, pois estamos completamente conectados. A cidade de Homs-Síria (foto), sofreu bombardeios das forças do Governo sírio em confronto com Rebelados que lutam pela retirada do poder de Bashar al-Assad, herdeiro de Hafez Assad. Assim está parte da cidade, destruída. Postei um comentário relativo a esta foto em um perfil da rede social facebook, não somaram dez o número de pessoas que de alguma forma se manifestaram. X possui 2.759 "amigos" na rede, X alterou sua foto de perfil e 578 pessoas marcaram sua passagem pela página de X, para felicitá-lo. X, jamais posta algo que seja realmente digno de alguma atenção. Eis a "Senhora Indiferença" personificada em nossos dias. Sloterdijik não é pessimista em sua visão acerca da indiferença, ele nem precisa ser. (De janeiro de 2011 até hoje mais de 150.000 civis perderam suas vidas em consequência do conflito).

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